"Ser mineiro" é uma coisa tão
especial, que virou tema de textos, correu o Brasil, virou expressão.
E são tantos estes textos! Muitos bem
escritos, geniais, como os de Carlos Drummond de Andrade e Fernando Sabino, outros
mais simples, como a alma do nosso interior, uns cheios de graças, com o falar caricatural,
com as lendas do nosso povo.
Podia escrever mais um, escolher um
caminho, quem sabe, inovar!
Ou falar das minhas montanhas, nosso mar
de serras, que marca nosso jeito, divide e une nossa gente. Ou dos cheiros e
sons que nos surpreendem a cada vez que nos pomos a passear, tantos os lugares,
os jeitos...
Mas vou ficar com a definição
maravilhosa de Guimarães Rosa: Minas, são muitas!
Muitas mesmo!
Quem já andou pelo nosso estado já pôde,
com certeza, constatar isto.
Temos a Minas dos sertões, das terras
duras, do calor, no nosso norte, no Jequitinhonha. Temos a Minas das águas, em
tantos rios e cachoeiras e lagos e represas. A Minas dos pedaços de mata, dos
capões, escondendo bichos e mistérios. A das cidades grandes, prósperas. A dos
municípios pequenos, muito pequenos, onde cada um é um conhecido, tem uma
história, que é de todos do lugar.
Temos serras e vales, campos altos,
muita chuva ou quase nada. Plantamos de todo jeito. Criamos bois, galinhas,
porcos, tudo!
Quando menino, tive a felicidade de
passear um bocado por Minas. Foi em uma época que minha mãe, sempre a dona dos projetos
da família, declarou que era um absurdo sair por aí, para outros estados e seus
lugares, sem conhecer a nossa terra.
E fui ver as nossas raízes, na Barbacena
de meus avós maternos, na Guanhães do lado de meu pai. (Para contar a verdade,
não era nada disto! Meu avô materno era de Nossa Senhora dos Remédios – daí,
dizem, ter se tornado farmacêutico e médico. Meu avô paterno era da região de
Guanhães, do povo que nascia pelos lugarejos. Meu pai, mesmo, nasceu em Dores
de Guanhães, no município, em uma fazenda que conhecemos, a Fazenda da Guarda –
um dia desses, ainda falo dela; merece. E minhas avós eram importadas, uma
portuguesa e a outra síria).
Conhecemos as cidades históricas,
visitando igrejas e museus. Passeamos pelas estâncias hidrominerais, bebendo
tanta água, de tantos jeitos, que nem dá para contar. Fomos a grutas e minas,
fazendas.
Fiquei com este primeiro retrato da
diversidade, a vida seguiu, anos depois venho a trabalhar na Rede Ferroviária.
E conheci mais um tanto de cidades e regiões, muitas outras realidades, outras
Minas.
Toda esta riqueza tinha que aparecer, é
claro, na cozinha.
Assim, que me desculpem os demais, mas
não há cozinha regional como a nossa!
Adoro experimentar, sou bom de paladar,
curioso até onde é possível. Não posso chegar a um lugar novo sem procurar o
prato local, os sabores e cheiros da região.
Temos cozinhas importantes, sem dúvida.
A baiana, a nordestina (que passeia pelos estados, sem conhecer fronteiras), a
da Amazônia. Temos pratos regionais fantásticos, em ambientes menores, como um
barreado, uma moqueca capixaba, um verdadeiro churrasco gaúcho.
Mas Minas são muitas.
Muitas são, também, as vertentes de
nossa cozinha. Como muitos são os seus ingredientes.
Aqui em BH, muitos anos atrás, Dona
Lucinha, em seu primeiro restaurante, separou os pratos que servia em cozinha
do tropeiro e cozinha da fazenda. Na primeira, pratos secos, de fácil
conservação. Na outra, a riqueza dos ingredientes, muitos caldos, grossos,
apurados no calor lento, sem pressa, dos fogões de lenha.
Como estas, outras tantas divisões.
Para mim, para o cozinheiro
experimentador, uma festa.
Verduras, carnes, preparos...
Fazer um prato mineiro é buscar estas raízes,
juntá-las, criar uma nova composição.
Daí não haver outra tão rica no nosso
Brasil. Que tenha tanta variedade, tanta diversidade.
Na nossa primeira mineiridade, vamos
atacar de costelinha de porco. Carne nobre, com a presença dos ossos e da
gordura, para dar sabor e textura.
E vamos juntar a couve, o fubá e o
feijão.
Tudo mineiro! Mas do nosso jeito
diferente de ser.
Costelinha Tejuco
(mineiríssima)
Costelinha de porco em
caldo grosso, acompanhada de couve rasgada, feijão fradinho refogado e arroz
especial
Temperar as costelinhas (picadas em
pedaços pequenos) com sal, alho, pimenta, cebola e deixar marinar por pelo
menos uma hora.
Fritar bem as costelinhas, em banha de
porco, até que estejam bem douradas e sem gordura aparente (este é um preparo
importante; a costelinha tem bastante gordura entranhada, assim, não há como
retirar a gordura antes do preparo; a fritura reduz bastante a gordura,
deixando o prato mais leve e saboroso; e preserva a carne, selando umidade em
seu interior). Escorrer e deixar secar em papel toalha.
Em uma panela nova, refogar as
costelinhas com um pouquinho da banha, alho amassado e uma colher de chá de
colorau. Deixar cozinhar, até que fiquem macias, pingando água, se necessário.
Corrigir o tempero com sal e pimenta. E
engrossar o caldo com fubá dissolvido em água. Servir com o caldo curto e
grosso (em nossa foto, jogamos um pouco do caldo sobre o arroz, para fazer um
prato mais bonito).
Preparar a couve rasgada (retirar os
talos das folhas e rasgar com as mãos), refogando na manteiga, com sal e alho
amassado.
Preparar o arroz, que deve ser bem
soltinho, feito na manteiga e no alho, sem dourar.
Com antecedência, deixe de molho o
feijão fradinho. Cozinhe-o, em bastante água, até o ponto de salada (macio, sem
desmanchar). Escorra e refogue na manteiga, com bastante cebola batidinha,
acrescentando um pouco de cebolinha verde, para finalizar.
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