quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Mineiridades (primeira parte)

"Ser mineiro" é uma coisa tão especial, que virou tema de textos, correu o Brasil, virou expressão.
E são tantos estes textos! Muitos bem escritos, geniais, como os de Carlos Drummond de Andrade e Fernando Sabino, outros mais simples, como a alma do nosso interior, uns cheios de graças, com o falar caricatural, com as lendas do nosso povo.
Podia escrever mais um, escolher um caminho, quem sabe, inovar!
Ou falar das minhas montanhas, nosso mar de serras, que marca nosso jeito, divide e une nossa gente. Ou dos cheiros e sons que nos surpreendem a cada vez que nos pomos a passear, tantos os lugares, os jeitos...
Mas vou ficar com a definição maravilhosa de Guimarães Rosa: Minas, são muitas!
Muitas mesmo!
Quem já andou pelo nosso estado já pôde, com certeza, constatar isto.
Temos a Minas dos sertões, das terras duras, do calor, no nosso norte, no Jequitinhonha. Temos a Minas das águas, em tantos rios e cachoeiras e lagos e represas. A Minas dos pedaços de mata, dos capões, escondendo bichos e mistérios. A das cidades grandes, prósperas. A dos municípios pequenos, muito pequenos, onde cada um é um conhecido, tem uma história, que é de todos do lugar.
Temos serras e vales, campos altos, muita chuva ou quase nada. Plantamos de todo jeito. Criamos bois, galinhas, porcos, tudo!
Quando menino, tive a felicidade de passear um bocado por Minas. Foi em uma época que minha mãe, sempre a dona dos projetos da família, declarou que era um absurdo sair por aí, para outros estados e seus lugares, sem conhecer a nossa terra.
E fui ver as nossas raízes, na Barbacena de meus avós maternos, na Guanhães do lado de meu pai. (Para contar a verdade, não era nada disto! Meu avô materno era de Nossa Senhora dos Remédios – daí, dizem, ter se tornado farmacêutico e médico. Meu avô paterno era da região de Guanhães, do povo que nascia pelos lugarejos. Meu pai, mesmo, nasceu em Dores de Guanhães, no município, em uma fazenda que conhecemos, a Fazenda da Guarda – um dia desses, ainda falo dela; merece. E minhas avós eram importadas, uma portuguesa e a outra síria).
Conhecemos as cidades históricas, visitando igrejas e museus. Passeamos pelas estâncias hidrominerais, bebendo tanta água, de tantos jeitos, que nem dá para contar. Fomos a grutas e minas, fazendas.
Fiquei com este primeiro retrato da diversidade, a vida seguiu, anos depois venho a trabalhar na Rede Ferroviária. E conheci mais um tanto de cidades e regiões, muitas outras realidades, outras Minas.
Toda esta riqueza tinha que aparecer, é claro, na cozinha.
Assim, que me desculpem os demais, mas não há cozinha regional como a nossa!
Adoro experimentar, sou bom de paladar, curioso até onde é possível. Não posso chegar a um lugar novo sem procurar o prato local, os sabores e cheiros da região.
Temos cozinhas importantes, sem dúvida. A baiana, a nordestina (que passeia pelos estados, sem conhecer fronteiras), a da Amazônia. Temos pratos regionais fantásticos, em ambientes menores, como um barreado, uma moqueca capixaba, um verdadeiro churrasco gaúcho.
Mas Minas são muitas.
Muitas são, também, as vertentes de nossa cozinha. Como muitos são os seus ingredientes.
Aqui em BH, muitos anos atrás, Dona Lucinha, em seu primeiro restaurante, separou os pratos que servia em cozinha do tropeiro e cozinha da fazenda. Na primeira, pratos secos, de fácil conservação. Na outra, a riqueza dos ingredientes, muitos caldos, grossos, apurados no calor lento, sem pressa, dos fogões de lenha.
Como estas, outras tantas divisões.
Para mim, para o cozinheiro experimentador, uma festa.
Verduras, carnes, preparos...
Fazer um prato mineiro é buscar estas raízes, juntá-las, criar uma nova composição.
Daí não haver outra tão rica no nosso Brasil. Que tenha tanta variedade, tanta diversidade.
Na nossa primeira mineiridade, vamos atacar de costelinha de porco. Carne nobre, com a presença dos ossos e da gordura, para dar sabor e textura.
E vamos juntar a couve, o fubá e o feijão.
Tudo mineiro! Mas do nosso jeito diferente de ser.


Costelinha Tejuco (mineiríssima)
Costelinha de porco em caldo grosso, acompanhada de couve rasgada, feijão fradinho refogado e arroz especial

Temperar as costelinhas (picadas em pedaços pequenos) com sal, alho, pimenta, cebola e deixar marinar por pelo menos uma hora.
Fritar bem as costelinhas, em banha de porco, até que estejam bem douradas e sem gordura aparente (este é um preparo importante; a costelinha tem bastante gordura entranhada, assim, não há como retirar a gordura antes do preparo; a fritura reduz bastante a gordura, deixando o prato mais leve e saboroso; e preserva a carne, selando umidade em seu interior). Escorrer e deixar secar em papel toalha.
Em uma panela nova, refogar as costelinhas com um pouquinho da banha, alho amassado e uma colher de chá de colorau. Deixar cozinhar, até que fiquem macias, pingando água, se necessário.
Corrigir o tempero com sal e pimenta. E engrossar o caldo com fubá dissolvido em água. Servir com o caldo curto e grosso (em nossa foto, jogamos um pouco do caldo sobre o arroz, para fazer um prato mais bonito).
Preparar a couve rasgada (retirar os talos das folhas e rasgar com as mãos), refogando na manteiga, com sal e alho amassado.
Preparar o arroz, que deve ser bem soltinho, feito na manteiga e no alho, sem dourar.
Com antecedência, deixe de molho o feijão fradinho. Cozinhe-o, em bastante água, até o ponto de salada (macio, sem desmanchar). Escorra e refogue na manteiga, com bastante cebola batidinha, acrescentando um pouco de cebolinha verde, para finalizar. 

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